Escrito por: Rogério Hilário
Presidente da CUT/MG; Wadson Ribeiro, do PCdoB; Duda Salabert; Letícia Kreuez e Maria do Rosário Barbato debatem com estudantes efeitos nefastos da Operação de Sérgio Moro e a Reforma do Sistema de Justiça
Centro Acadêmico Afonso Pena (CAAP), Federação Nacional dos Estudantes de Direito, Associação Brasileira dos Juristas pela Democracia (ABJD), União Estadual dos Estudantes (UEE) e União Nacional dos Estudantes (UNE) realizaram na quarta-feira, 1º de junho de 2022, o debate Democracia e Justiça, com os temas Operação Lava Jato e Reforma do Sistema de Justiça. Participam como convidados e debatedores o presidente da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais (CUT/MG); a vereadora Duda Salabert Rosa (PDT); o presidente estadual do PCdoB, Wadson Ribeiro; Letícia Kreuez, professora de Teoria do Estado e Direito Parlamentar; e Maria do Rosário Barbato, presidenta do Sindicato dos Professores da Universidade Federal de Minas Gerais (APUBH). O debate foi realizado no auditório da Faculdade de Direito da UFMG.
Na abertura do debate, falaram Kessia Cristina, da UNE, e Leonardo Carnonha, do Levante Popular da Juventude. Os dois ressaltaram o papel destrutivo da Operação Lava Jato nos setores civil, empresarial e, principalmente, na Petrobras. E que, ainda, desencadeou um processo que consolidou o obscurantismo no país, com o governo de Jair Bolsonaro, que colocou o Brasil nesta situação insuportável.
Kessia enfatizou que a UFMG e a Faculdade de Direito sempre estiveram no centro das ações pela soberania nacional. Ainda mais durante a pandemia de Covid-19, com a produção de equipamentos de proteção individual (EPIs) e a busca de vacinas. A Escola de Direito foi a primeira ocupada na resistência ao golpe de 2016. Estamos de novo no centro, na agenda deste governo, que cortou em R$ 32 milhões o investimento na UFMG”, disse a diretora da UNE.
O presidente da CUT/MG fez um retrospecto da Operação Lava Jato. “O processo, é bom lembrar, teve origem em 2013. Começou com as mobilizações em São Paulo, por causa do reajuste de 20 centavos na tarifa de transporte. As manifestações que se espalharam pelo país foram apropriadas pela direita e pela grande mídia, com a demonização da política e o pretexto da luta contra a corrupção. Aécio, mesmo com toda a sua arrogância, não aceitou perder a eleição para Dilma Rousseff, depois de todos os ataques que o PT sofreu. Perdeu com uma diferença de 3 milhões de votos, o que levou o PSDB a questionar a validade da urna eletrônica e pedir a recontagem de votos. Aécio deixou claro: Dilma vai ganhar a eleição, mas não vai governar”, disse Jairo Nogueira.
“A Lava Jato começou em 2014, com Sérgio Moro, um amigo de Aécio. Lembremos que na linha de ataque à corrupção. Diariamente, e imprensa, especialmente a Globo, mostrava a imagem com dinheiro saindo enlameado de um cano. Coincidentemente, houve o golpe de 2016, com um histórico de mudança da política nacional. E do direito culpando por convicção. Ou seja, eu quero que seja assim, e você que não é culpado. A Lava Jato, a mudança de cenário e suas consequências nos deixaram na retaguarda. Quero deixar bem claro: nós somos contra a corrupção. Mas o modelo dessa operação expôs as empresas. A Lava Jato gerou, diretamente, 4,4 milhões de desempregados e uma queda de 3,6% no PIB. Um prejuízo de R$ 170 bilhões. E, logo depois, Sérgio Moro aceitou ser ministro no governo de Jair Bolsonaro. Antes, sofremos, com Temer, o congelamento por 20 anos dos investimentos em educação e saúde. Veio a Reforma Trabalhista e, com Bolsonaro, a Reforma da Previdência”, disse o presidente da CUT/MG.
“Não podemos esquecer que a operação tirou Lula da eleição de 2018. Está provado que Sérgio Moro agiu com parcialidade. A Lava Jato resultou na eleição de Jair Bolsonaro. Este é o momento de pensar o que está acontecendo no Brasil, tanto na questão jurídica quanto política. Os jovens estão descontentes, sem esperança. O contexto atual do país não dá aos jovens muita perspectiva. É preciso mudar este cenário, para voltarmos a ter esperança. Lutaremos para mudar a realidade. A nossa luta é para derrubar Bolsonaro. A Lava Jato é um exemplo do que não deve acontecer nunca mais. Tentaram oficializar a corrupção com a ação dos lobistas. Teremos que desmontar, com Lula, o que o Bolsonaro fez. E a juventude é fundamental nesta luta”, acrescentou Jairo Nogueira.
Letícia Kreuez fez uma comparação entre a Lava Jato e o impeachment. Segundo ele, na operação ficou claro o uso do lawfare que, entre seus propósitos, tem o uso indevido de recursos jurídicos para fins de perseguição política. “O lawfare virou moda, principalmente com o caso Lula. Ele se contrapõe ao warfare, que preconiza o ataque militar, pois comprova que isso não é preciso para destruir ou inviabilizar um país inimigo. Não é preciso gerar conflito armado, basta, por exemplo, um bloqueio comercial, uma ação dissimulada, para gerar miséria, fome e desestabilização. Ou seja, usar e abusar da lei, como dizia Charles Dunlop Jr. O próprio sistema pode se encarregar disso, com a criminalização do indivíduo. Ainda mais num país em que o perfil dos juízes é de cunho racista. Isso resulta na determinação de que determinados grupos sejam retirados”, analisou a professora da Faculdade de Direito da UFMG.
“Eduardo Bolsonaro, por exemplo, tem um projeto que criminaliza e extingue o PCdoB. É a lógica do amigo-inimigo. Uma guerra civil legal. Um instrumento para realizar o mau uso do direito, como criar categorias não existentes. Olha o que aconteceu na Lava Jato. Um áudio da presidenta da República foi vazado. Isso não seria admissível em outros países. Houve a condição coercitiva de uma pessoa sem qualquer prova contra ela. A gente entrou sabendo qual seria a sentença. Uma condenação chancelada pelo Estado. E ninguém acionou uma corregedoria para barrar a ação do juiz, que não tinha competência para fazer a operação. São externalidades das ações jurídicas. Não se vê moralidade, imparcialidade, acordo com pessoas. Uma Justiça com recorte racial extremo, contra preto, pobre. Justiça enviesada”, definiu.
No caso do impeachment a presidenta Dilma Rousseff, Letícia Kreuez enfatizou a política do jogo duro constitucional. “Aos amigos tudo, aos inimigos o rigor da lei. A Globo já publicava em seu site, em 2016, o placar do impeachment. O Judiciário fez a escolha dos inimigos. Com a juristocracia, começou-se a ver o Judiciário como salvador da pátria. Já havia acontecido com Joaquim Barbosa, com o Mensalão. E depois veio Sérgio Moro. Mas, acredito, é possível reverter o cenário atual. Temos as eleições daqui a quatro meses e vocês, estudantes de Direito, têm um papel essencial nesta mudança”, afirmou a professora.
Para o presidente do PCdoB em Minas Gerais, Wadson Ribeiro, participar de um debate na Escola de Direito da UFMG o fez remontar o tempo de militante do movimento estudantil. “Tempo feliz por relembrar a minha vida no movimento estudantil. E por participar de uma atividade importante neste contexto político, em que ocorrem desestabilizações. Que país era aquele em que vivíamos, com três vitórias da esquerda nas eleições. O Brasil criou o Brics, houe grande mobilidade social. A taxa de desemprego em Belo Horizonte baixou para 5%. Tínhamos políticas sociais, acesso à universidade. Com uma mulher na Presidência. Daí, surge o golpe. Setores que não tinham como vencer as eleições, apelaram para o golpe. Como o Jairo bem lembrou, as tentativas de golpe começaram com o Mensalão, houve as mobilizações de 2013 e, por fim, o processo de lawfare da Lava Jato desconstruiu a base do sistema político brasileiro. Com um processo viciado. No nosso entendimento, combate à corrupção não pode ser uma bandeira, mas um princípio”, afirmou.
“A Lava Jato produziu o governo Bolsonaro. E Moro não pensou duas vezes em aceitar o cargo de ministro da Justiça. A elite tapou o nariz e aceitou qualquer um, desde que não fosse da esquerda. Houve a demonização da política, a exclusão da política. Tudo isso teve consequências econômicas. O Brasil está caminhando a passos largos para retornar à era pré-Getúlio Vargas. Nossa tarefa é derrotar Bolsonaro. Mas só isso não resolve o problema. Precisamos de uma plataforma de recuperação nacional. Vejam uma das últimas propostas do governo. Cobrar mensalidade nas universidades públicas. Isso nada resolve financeiramente. É um projeto ideológico. Nossa tarefa é construir uma grande unidade para restabelecer o pleno estado democrático de direito”, finalizou Wadson Ribeiro.
“Me preparei para o debate para discussão sobre Direito e Democracia. Não tanto para questões da Lava Jato, embora tenhamos um presidente lgbtfóbico eleito. Houve um ruído na comunicação. Eu considero a Lava Jato um grande atentado à Justiça e à democracia. Porém estou aqui para falar sobre direitos sociais e ambientais. Ainda mais diante de uma luta pelo tombamento da Serra do Curral. Se está em processo de tombamento, tombada está. Isso foi desconsiderado e aprovada a mineração pela Tamisa de madrugada. Algo absurdo, que vai impactar as nossas saúdes. A mineração é uma ideologia. Criou-se a falácia de que ela é essencial para a Minas Gerais. Mineração representa apenas 4% do PIB do Estado e 1,8% dos empregos gerados. A vocação das mineradoras é moer montanhas, manter o Brasil no estágio de neo-colônia, triturar nossos patrimônios”, denunciou a vereadora Duda Salabert.
“Na semana passada, o nosso mandato subiu a serra e encontramos uma mineração ilegal. Duas horas depois, nos enviaram uma mensagem que mostrava explosões feitas pela mineradora. O Ministério Público estipulou multa de R$ 20 milhões, uma ninharia para uma empresa deste porte. Vejam só, a Vale fez um acordo de pagamento por nove anos de uma multa de R$ 24 bilhões, valor que significa apenas 17% do lucro anual da empresa. Que justiça é essa? Segundo os especialistas, somos a última capaz de conter as mudanças climáticas. Sem exigência ambiental, sem justiça climática, caminhamos para a extinção em massa”, disse.
Para Duda Salabert, tão grave quanto a questão da justiça ambiental é falta de justiça social. “Existe neste país o genocídio transexual. Transexuais são assassinados e 80% desses homicídios são com requintes de crueldade. Noventa por cento de prostituem, 45% estão com HIV, 90% não concluíram o ensino fundamental. É um genocídio a céu aberto. Eu pergunto, que justiça é esta? Belo Horizonte elegeu a primeira vereadora transexual, a mais votada de toda a história. Já recebi três ameaças de morte e disseram, em mensagens, que a minha escola se transformaria num banho de sangue. Fui demitida. Hoje tenho que implorar por segurança ao meu partido. Pelo visto, vamos ter a eleição mais violenta. Um vereador bolsonarista me disse que Marielle (Franco). Foram quatro tiros na cabeça. Fazem isso para que o enterro seja com caixão fechado. A família não tem nem o direito de se despedir de um ente querido. Que justiça é esta?”, questionou a vereadora.
“Temos que tirar Bolsonaro, que personifica esta política, e Zema, representante dela no Estado. É nosso dever eleger candidatos do campo progressista, tendo uma visão crítica, com um programa democrático. Vamos discutir a tentativa de acabar com a universidade pública e gratuita. Não se fala nisso na Argentina, na Bolívia, no México, em Cuba. Lá querem deixar a universidade mais popular. Aqui, o projeto educacional é elitizar a universidade. Há esperança e ainda faltam quatro meses para as eleições. Nós venceremos e a faísca desta vitória vai vir de vocês”, afirmou Duda Salabert.