Escrito por: Amélia Gomes - Brasil de Fato Minas Gerais
Acordo converte multas do crime em Brumadinho em aval para entrada da mineradora em reservas ambientais
No início deste mês o governo federal, por meio do Ministério do Meio Ambiente, o governo de Minas Gerais, sob o comando de Romeu Zema (Novo) e a mineradora Vale firmaram um acordo que converte as multas aplicadas à empresa pelo Ibama em "investimentos" em sete parques nacionais de Minas Gerais: Caparaó, Grande Sertão Veredas, Caverna do Peruaçu, Sempre-Vivas, Serra do Gandarela, Serra da Canastra e Serra do Cipó.
O documento, assinado no último dia 6, é referente à compensação imposta à Vale pelo maior crime socioambiental cometido pela empresa: o rompimento da barragem de Córrego do Feijão, em 25 de janeiro de 2019, que deixou quase 300 vítimas fatais. De acordo com o termo, o recurso se dividirá sendo R$ 150 milhões destinados para obras nos parques e R$ 100 milhões em obras de saneamento e no Programa Lixão Zero.
No entanto, movimentos sociais denunciam que na verdade o acordo não passa de uma manobra para que a mineradora tenha acesso às reservas ambientais que são de interesse da empresa. Há tempos Ricardo Salles, atual ministro do Meio Ambiente, tentava converter a punição da minerada em “prêmio”. Em abril de 2019, o ministro twittou em sua conta pessoal que estava tentando realizar o acordo, agora firmado.
Luiz Paulo Siqueira, da coordenação do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), denuncia que o episódio é um exemplo de como a Vale está articulada dentro dos governos.
"Essas áreas são estratégicas para a Vale, ela já pleiteia atuar nessas regiões há vários anos. Na Serra do Cipó, onde ficam os municípios de Conceição do Mato Dentro e Morro do Pilar, a Vale possui vários direitos minerários e projetos de exploração", explica.
O dirigente alerta ainda que o avanço da mineradora pode comprometer o abastecimento na região metropolitana de BH. "No Parque da Gandarela, ela tem um grande projeto com expectativa de exploração de 40 milhões de toneladas por ano. Durante muito tempo a população tem conseguido barrar o avanço desse projeto, mas esse acordo coloca tudo em risco", adverte.
"É permitir que novos crimes aconteçam"
Apesar das multas serem relativas a penalidades que a empresa cometeu como "causar poluição que acarretem danos à saúde humana" e "causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento de água", como cita o documento do Ibama, a compensação do crime, não reverte nenhum dos danos, pelo contrário. É o que avalia Eloá Magalhães, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
"Nos dois crimes, a Vale sempre nega a contaminação do rio, a destruição de sítios arqueológicos, da vegetação, a morte de animais silvestres e o que os desdobramentos das contaminações vão causar ao longo dos anos. Então, fazer um acordo desse é permitir que novos crimes contra o meio ambiente aconteçam", aponta.
Eloá ressalta que o acordo, assim como outras ações da empresa, apenas maquiam a situação, e que na prática a mineradora nunca soluciona os problemas ambientais e sociais causados por ela. Outra reivindicação dos atingidos é que em momento algum as comunidades envolvidas foram ouvidas sobre o caso. "Nunca há debate com as comunidades atingidas. A postura de atuação da Vale é fazer acordos como este, por cima, arbitrários, sem a participação dos atingidos", denuncia a militante.
A postura não se restringe à mineradora. O próprio ministro do Meio Ambiente chegou a afirmar que "o acordo serviu para evitar uma longa discussão de aplicação de recursos", como declarou Salles em reportagem à Agência Brasil.
Parques estaduais já estão no “balcão” de Zema
Desde o dia 2 de julho está aberto o edital do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) para a concessão do Parque Estadual do Ibitipoca à iniciativa privada. O edital é o primeiro da lista de 21 parques estaduais que estão na lista do Programa de Concessão de Parque Estaduais, da Secretaria Estadual de Meio Ambiente.