Escrito por: Rogério Hilário, com informações de O Tempo, Hoje em Dia e Brasil de Fato
Manifestantes questionam auditoria feita pela Prefeitura e defendem passagem de R$ 3,45
Integrantes do Movimento Tarifa Zero ocuparam três faixas da avenida Afonso Pena, no Centro de Belo Horizonte, na noite de quinta-feira (10), em protesto contra o reajuste de 11% nas tarifas de ônibus do transporte coletivo da capital. A manifestação aconteceu na porta da Prefeitura. No início da noite, eles se concentraram na Praça Sete.
Segundo os organizadores, a manifestação reuniu centenas de pessoas e é contra o reajuste que o coletivo considera um crime contra a população, especialmente os mais pobres e os que moram mais longe. Eles também fazem críticas ao prefeito Alexandre Kalil (PHS) e às empresas dos coletivos. “Estão fazendo barganha com a lei os direitos da população, já que os ‘benefícios’ anunciados não passam de condições mínimas asseguradas pela lei. Ter trocador em todos ônibus não é favor, é a lei 10.526! Renovar a frota não é favor, é cumprir o contrato”, dizem.
O movimento ainda criticou a auditoria feita pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) que, segundo o prefeito Alexandre Kalil (PBH), abriu a “caixa-preta” da BHTrans. A auditoria apontou que a passagem de ônibus na capital deveria custar R$ 6,35, quando o valor praticado era de R$ 4,05.
O Tarifa Zero fez um estudo que mostrou que a passagem em BH deveria ser R$ 3,45. “Se a prefeitura falou que as empresas estão no prejuízo assim, como é que elas ficaram tantos anos em operação? Caridade é que não foi”, publicou o movimento nas redes sociais.
Na época em que os resultados da auditoria foram apresentados, a prefeitura ressaltou que foram analisados 104 mil documentos da BHTrans e das empresas de ônibus da capital. Ainda conforme o Executivo, os resultados da auditoria estão disponíveis no site da prefeitura para consulta de qualquer cidadão.
Em São Paulo, também houve manifestação nas ruas contra o aumento da tarifa do transporte coletivo. O Movimento Passe Livre (MPL) foi às ruas protestar contra o reajuste de 7,5% nas passagens – a tarifa passou de R$ 4 para R$ 4,30 no dia 7 de janeiro. O MPL quer discutir outras questões, como o corte de linhas.
Artigo (*)
Sem trocador nos ônibus: o ser humano separado do seu trabalho
Fica explícito o interesse das empresas privadas na garantia do direito ao transporte: o lucro
Algumas pessoas acham que a tecnologia avançou e, portanto, não seria mais necessário um trabalhador presente para a função de cobrador - Créditos: Foto: Divino Advincula/PBH
Algumas pessoas acham que a tecnologia avançou e, portanto, não seria mais necessário um trabalhador presente para a função de cobrador / Foto: Divino Advincula/PBH
Começou como um ajuste ou mesmo um teste, mas a partir de 2016 os ônibus da região metropolitana de Belo Horizonte gradativamente passaram a circular sem o agente de bordo, conhecido popularmente como cobrador ou trocador de ônibus. Uma tendência? Uma mudança? Economia? Era útil ou não este trabalhador? Perguntas cujas respostas ficam óbvias para passageiros na falta deste profissional nos coletivos.
Algumas pessoas acham que a tecnologia avançou e, portanto, não seria mais necessário um trabalhador presente para esta função. Outros de forma mais objetiva procuram responder com a afirmação de que o custo do transporte passa pelo número de servidores e a partir do momento que não há mais um cobrador este custo não ficaria para quem paga as passagens.
Mas e o trabalhador e a trabalhadora? Aquele ser humano, que tem uma vida, família e estava presente no cotidiano do transporte público. Os motoristas têm dado prova de que não é verdade a afirmação de que a tecnologia resolveu o problema das cobranças. Os motoristas viraram também cobradores, passaram a ter as duas funções. O resultado desta pressão ao longo dos últimos anos se expressa nos vários acidentes de trânsito (alguns que tiveram morte) que ocorreram por conta da dupla atribuição imposta pelas empresas. Quanto ao custo, não houve o repasse por meio da diminuição do valor das passagens para quem utiliza o transporte público.
Algumas destas perguntas podem ser respondidas com um olhar mais profundo sobre o papel do trabalho na sociedade moderna. O que há neste cenário desfavorável aos mais pobres é o sucateamento do direito constitucional da liberdade. O ir e vir se precariza com a ausência do agente de bordo, como se importasse apenas as passagens pagas. Este trabalhador e essa trabalhadora tinha como atribuição profissional garantir, por exemplo, o acesso das pessoas com deficiência aos coletivos seja no manuseio do elevador para usuários de cadeira de rodas, ou mesmo no diálogo com os demais usuários do transporte público e orientações gerais.
A garantia da cidadania passa não pela cobrança da passagem de ônibus, mas pela qualidade e garantias sociais que o transporte disponibiliza. A figura humana é insubstituível em relação a qualquer custeio ou tecnologia que garanta a cobrança de passagens.
De acordo com a teoria crítica, a alienação se torna objetiva quando procura separar o trabalho do ser humano. Esta separação tende a perceber os trabalhadores apenas como suas funções profissionais e não como seres criativos, coletivos e presentes na consolidação do trabalho enquanto transformação. As afirmações que se apresentam com a saída dos cobradores é que o importante agora é o pagamento e não todas as outras possibilidades no mundo do trabalho que o trabalhador tinha como responsabilidade.
Passados dois anos, além da demissão em massa destes trabalhadores o que fica é o incomodo da população. Fica explícito o verdadeiro interesse das empresas privadas na exploração de um serviço público e na garantia do direito ao transporte: o lucro. Ônibus devem servir a coletividade e não ao lucro.
(*) Leonardo Koury Martins é assistente social, professor e militante da Frente Brasil Popular