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Governo Zema impõe sigilo a laudo de estatais e oposição reage: ‘Querem nos enganar’

Documentos produzidos pela Goldman Sachs teriam indicado preço de empresas usadas nas negociações da dívida de Minas com a União

Publicado: 14 Outubro, 2025 - 12h59

Escrito por: Hermano Chiodi / O Tempo

Nilani Goettems/Valor
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Em meio às negociações para abatimento da dívida de Minas Gerais com a União, o governo Romeu Zema (Novo) impôs sigilo a documentos elaborados pela consultoria internacional Goldman Sachs, que teriam avaliado o valor de empresas estatais incluídas nas tratativas com o governo federal.

A decisão provocou reação imediata da oposição na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), que acusa o Executivo de esconder informações que poderiam alterar o rumo das negociações e enfraquecer o discurso favorável à privatização de outras estatais, como a Copasa, cuja proposta de venda avança rapidamente no parlamento mineiro.

Um dos relatórios sob sigilo é descrito como “Projeções Financeiras da Codemig”, colocado em segredo pelos próximos 15 anos. Parlamentares da oposição acreditam que o documento apontaria um valor de mercado da Codemig superior a R$ 34 bilhões, montante suficiente para quitar parte da dívida e garantir a entrada exigida pelo governo federal para adesão do estado ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), sem a necessidade de novas privatizações.

“Nós, mineiros, não temos o direito de saber quanto a Codemig vale (por causa do sigilo). O governo federal poderia muito bem utilizar essa avaliação para aceitar a Codemig como parte do pagamento do Propag. No que nós desconfiamos é que a avaliação atingiu muito mais que os R$ 34 bilhões e isso faz que o governo não tenha nenhum discurso a mais para vender a Copasa. Querem nos enganar, mas estou entrando com um pedido para a quebra do sigilo desse documento, porque a Assembleia, como ente fiscalizador, tem total direito de acesso a esse documento”, disse o deputado estadual Professor Cleiton (PV).

A Codemge argumenta que o sigilo imposto aos documentos não tem relação com o Propag. De acordo com a assessoria da empresa, o intuito de colocar sigilo deve-se a negociações em curso para renovação de parcerias comerciais. 

"De maneira a assegurar o valor dos ativos sob responsabilidade do Grupo Codemge, estudos e conversas sobre possível renovação da parceria entre Codemig e CBMM na exploração do nióbio estão em andamento. Devido à natureza estratégica da eventual renovação, alguns documentos estão classificados como sigilosos para proteger os interesses do Estado de Minas Gerais enquanto acionista majoritário", diz nota da empresa.

A Codemig mantém sociedade com a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) constituída para explorar nióbio em Araxá, Alto Paranaíba. Em vigor desde 1973, o acordo dá à CBMM o direito à lavra das jazidas até 2032 e, como contrapartida, 25% do lucro líquido da operação é repassado ao governo estadual. Apenas em 2024, esse repasse de dividendos foi de, aproximadamente, R$ 1,7 bilhão.       

Especulações antigas

A existência da avaliação feita pela Goldman Sachs foi mencionada em maio deste ano pelo vice-governador Mateus Simões (Novo), durante audiência na ALMG. À época, ele afirmou que os valores levantados pela consultoria coincidiam com estimativas atuais da oposição.

“A avaliação feita pela Goldman Sachs indica que a Codemig e a Codemge deveriam valer entre US$ 4 bilhões (R$ 22 bi) e US$ 6 bilhões (R$ 32,8 bi) . Óbvio que prefiro a de US$ 6 bilhões”, disse Simões na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária.

Naquele momento, o estudo não podia ser utilizado oficialmente nas negociações com a União, já que o decreto original do Propag determinava que as avaliações válidas deveriam ser realizadas pelo BNDES. Por isso, o governo argumentava que era necessário insistir na autorização para outras privatizações para garantir uma "reserva", caso a União rejeite algum ativo ou apresente uma avaliação muito menor daquela com a qual o governo do estado tem trabalhado.

Cenário novo

O quadro mudou com o novo decreto federal publicado em 7 de outubro, que passou a permitir o uso de laudos de consultorias independentes, como o da Goldman Sachs, na adesão ao Propag.

Pelas regras, o estado precisa oferecer como entrada 20% da dívida total, hoje estimada em R$ 170 bilhões, para garantir condições de pagamento mais vantajosas — com parcelas corrigidas apenas pela inflação. O valor necessário, portanto, é de cerca de R$ 34 bilhões.

Para alcançar esse montante, o governo enviou à Assembleia projetos que incluem a venda de estatais (Codemig, Codemge, Copasa e Cemig), além de alienação de imóveis e antecipação de créditos. Parte dessas propostas já foi aprovada, incluindo a federalização da Codemig e da Codemge.

Ainda assim, o Executivo defende que será necessário avançar na privatização da Copasa, alvo de resistência e obstrução da oposição.

Com as novas regras federais e a suspensão temporária dos prazos do programa, as votações relacionadas ao Propag estão paradas na ALMG, devendo ser retomadas apenas na próxima semana.

*Com informações de Gabriel Ferreira Borges