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“Parceria com a CUT e inserção nos movimentos sociais foram grandes ganhos do Sindifisco-MG”, diz Lindolfo Fernandes

Sindicalista deixa a direção da entidade, após dez anos de luta e enfrentamentos com o governo do Estado

Publicado: 12 Dezembro, 2013 - 11h56

Escrito por: Rogério Hilário

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Lindolfo Fernandes de Castro com balanLindolfo Fernandes de Castro com balanSão 27 anos de Secretaria de Estado da Fazenda, mais de 20 de atividade sindical e outros 10 na direção do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais (Sindifisco-MG). Nesta semana, Lindolfo Fernandes de Castro deixou a presidência da entidade, com a posse da nova diretoria. ”Vou continuar como base. A gente não precisa de cargos de direção do sindicato para fazer a luta sindical. Vou fazer um trabalho de oposição construtiva, olhando para frente, tentando procurar crescer”, garante.

Nesta entrevista, Lindolfo Fernandes fala das conquistas do Sindifisco-MG, da importância da parceria com a Central Única dos Trabalhadores (CUT) em inúmeros movimentos, e da união com sindicatos da base CUTista, que resultaram em manifestações e campanhas, como a do Plebiscito Popular pela Redução da Tarifa e Energia e do ICMS. Para ele, os cenários políticos e econômicos de 2014 serão difíceis, mas é preciso lutar pela alternância de poder no Estado, que está falido e não suporta mais o modelo neoliberal. “Para reverter isto é preciso de luta permanente. É isto só será possível com a preciso união dos trabalhadores, dos sindicatos mais combativos.”

Você está há dez anos na diretoria do Sinfisco-MG. O que aconteceu neste período?

Os mandatos aqui são de dois anos. Tive quatro mandatos. Tive a oportunidade de ser eleito quatro vezes e nenhuma destas eleições foi com chapa única. Todas tiveram disputa, duas ou três chapas. Tive a confiança da categoria para desempenhar estes dois mandatos. Além disso, eu fui diretor de relações sindicais numa outra gestão e exercer nos quase 27 anos de Secretaria da Fazenda devo ter mais de 20 na atividade sindical. Participamos da primeira greve na Fazenda, em 1988, quando não tinha nem sindicato, não estava vigorando. Depois nós fizemos uma greve em 1989, também estive na liderança deste movimento. Tivemos outra em 1993, uma greve geral dos servidores públicos, em que ficamos 73 parados. Depois retornei ao sindicato em 2002, como diretor. Pegamos um quadro difícil em 2003, no primeiro mandato, um cenário do choque de gestão e das reformas administrativas que foi uma retirada de direitos históricos da categoria, como os adicionais por tempo de serviço, o fim dos apostilamentos, o estabelecimento de teto, a quebra da estabilidade, quebra de paridade. Enfrentamos aí um período difícil do choque de gestão que é a linha neoliberal: quanto menor o Estado, segundo a filosofia deles, melhor. E neste período nós começamos a trabalhar na questão da carreira, que era uma luta da categoria há muito tempo, pois existiam duas classes de fiscais que unia aquelas duas classes. Depois o movimento das tabelas. Depois fizemos outro movimento que durou sete meses que misturado com a greve, com uma greve branca com paralisações, às vezes autuações zero, na linha a la Gandhi com resistência pacífica. E fomos conseguindo ganhos nesse período. Aí de dezembro de 2007 a dezembro de 2009 eu estive ausente. Eu não fiz a sucessão porque só pode uma reeleição. Retornei em dezembro de 2009 e recomeçamos já resolvendo uns problemas sérios de conflito interno. Estava havendo mais um movimento. Resolvemos o movimento e continuamos na luta. Mas linha que adotamos que eu considero uma linha moderna de sindicalismo, que você inova, é você não se ater apenas às demandas corporativas e também defender as questões de interesse público. O que é uma categoria de servidor público que não consegue provar para a sociedade da sua importância, não consegue o reconhecimento dela está fadada à extinção. Então não começamos a trabalhar mostrando que nós somos carreira de Estado não carreira de governo, que  estamos numa área estratégica que é a arrecadação de tributos. Temos o dever de mostrar, dar uma alternativa para a população, mostrar um outro olhar sobre a administração tributária, sobre as finanças públicas. Então é o papel do sindicato fazer isso. E buscar um sistema tributário mais justo, pois nós temos um dos sistemas tributários mais injustos do mundo. E por ser de interesse público, não estar dissociada também do interesse corporativo, porque quanto mais justo o sistema tributário mais valorizada será a categoria. Então, maior será o recolhimento voluntário destes tributos, menor a sonegação. É um dever dos auditores fiscais e do Sindicato dos Auditores Fiscais fazer esse debate com a sociedade, você mostrar, discutir orçamento, fazer disputa de orçamento, discutir finanças públicas, discutir tributação. E para isso fizemos durante este ano todo uma campanha, que também foi uma inovação. Eu não conheci nenhum sindicato que tenha feito quase um ano de debates com o governo do Estado, desmistificando as falácias, o choque de gestão, que na realidade não passa de um produto de marketing. Fizemos isso de uma forma deliberada, com a categoria, os movimentos internos que tinham as demandas corporativas, mas não dissociada do interesse da sociedade. E conseguimos ter um retorno muito bom com a população, da sociedade e isso é importante porque você melhora a imagem da categoria. A categoria passa a respeitar mais a população, passa a respeitar mais a função, que é uma função importante para você trazer recurso, para que este recurso não seja desviado, sonegado e seja carreado para as áreas sociais, que são tão carentes como a questão da educação, pois está vendo que o governo não aplica o mínimo, não paga o piso nacional. A questão da saúde também, a reforma agrária, habitação, saneamento. Isso é papel do servidor público. Nós conhecemos a realidade do serviço público.

E como foi o recente processo eleitoral do sindicato?

O pessoal da ativa entendeu muito bem isso a nossa linha.  Infelizmente, tivemos uma eleição no dia 19 de novembro, eu não estava como candidato, mas apresentei uma chapa de continuidade e acabou que a categoria fez uma opção por um outro modelo. Então, a gente está encerrando a linha do sindicato cidadão. Espero, e isso vai ser submetido depois à avaliação da categoria, ou seja, ela pode entender até entender e retomar, a campanha na mídia nós também estamos encerrando, enfim, a gente sabe que estamos saindo de cabeça erguida, porque tivemos resultados concretos, triplicamos a remuneração dos servidores de 2005 para cá, num cenário, não está na linha do governo da valorização do serviço público. O maior indicador de uma liderança sindical é o que ela melhora na vida da sua base filiada. Além do resultado financeiro que nós trouxemos para as famílias da base filiada nós tivemos também um trabalho, uma contribuição com a sociedade ao trazer essa realidade do tributo, que até então parecia que era coisa de economista, dos políticos, dos empresários, mostrando que o trabalhador pode discutir tributo. Nós fizemos um sindicato, ao contrário do que foi levantado pela chapa vencedora, mais próximo da população, principalmente da mais carente. Um sindicato mais próximo dos trabalhadores, um sindicato que entra na pauta dos trabalhadores, não querendo ou impondo, do conjunto e da sociedade, procuramos fazer uma gestão nesta linha e acho que a categoria cresceu muito com isso. Mas, infelizmente, nós estamos chegando ao fim deste ciclo com a posse da nova diretoria, que propõe uma nova condução, inclusive de encerramento da campanha.

Você vai manter a ação sindical?

Vou continuar como base. A gente não precisa de cargos de direção do sindicato para fazer a luta sindical. Lógico que terei umas dificuldades por não ter mais à disposição a estrutura, o aparelho da entidade, mas vamos indicar rumos, apresentando ideias, pois a construímos um capital político dentro da categoria, pois existem pessoas que acreditam na gente. Vou fazer um trabalho, não diria de oposição, mas de oposição construtiva, olhando para frente, tentando procurar crescer, porque, na realidade se a gente não fizer isso é um tiro no pé, porque vivemos ameaças o tempo todo. Nós que temos a compreensão do conjunto da coletividade não podemos parar. Vou ajudar no que for possível os demais sindicatos, os movimentos sociais. Vou dar a minha modesta contribuição, porque não dá para parar. Você acaba, como diz o poeta, você é responsável por quem você cativa.

Poderia citar outras conquistas do Sindifisco para a categoria?

Sob o ponto de vista financeiro nós tivemos a questão da carreira. Se não foi a ideal, porém avançamos bastante. Foi uma luta com movimentos. Fizemos movimento de tabela e tudo mais. A carreira que era um sonho das duas categorias, fiscais e agentes fiscais unificar, nós os transformamos em auditores. Nós tínhamos o pior piso da fiscalização dos estados, hoje nós temos um dos melhores pisos. Tudo da luta. Paramos um movimento e entramos com outro. Á questão da melhoria do piso. Além disso, tivemos um trabalho importante que é a inserção do sindicato nos debates da sociedade, questão da imagem, da luta por valorização das atribuições do fiscal, a luta pelo combate à sonegação, o combate à corrupção, pois sabemos como essas coisas são interligadas. Foram muitas as conquistas. Para os aposentados, o Estado quebrou a paridade prejudicando os aposentados. A paridade é um atrelamento da remuneração do inativo com os da ativa. O governo, no choque de gestão, quebrou isso e a reforma da Previdência também. A gente está recuperando isso, estamos deixando mais ou menos resolvido, embora de forma parcelada. Essa campanha da mídia, embora ela tenha ido por um caminho muito ruim, porque o debate eleitoral nosso foi mais no gasto, e eu não considero como gasto e, sim, como investimento. Eu disse para o pessoal que gastamos em média R$ 1,2 mil por fiscal. E a categoria teve um retorno de R$ 2 mil com a luta toda. Então, que investimento que vai agregar um patrimônio para a vida toda, que investimento dá um retorno desse. Além de fazer esse trabalho importante com a população e denunciar as mazelas do serviço público. Fomos o único sindicato a fazer um debate político e fundamentado até questionando a verdade do choque de gestão, produzindo material, não só esse “A Verdade sobre o Choque de Gestão”, mas o anterior que fizemos em 2006 e deixamos o governo em uma situação complicada. Ele sentiu o golpe. Tanto é que entrou com uma ação contra o sindicato na Vara de Fazenda Pública, dizendo que estávamos ferindo a honra objetiva do Estado, que é um absurdo, porque na realidade o Estado é uma ficção jurídica, torna uma coisa concreta com seus servidores. Que honra é essa. Não conseguiu vitória nisso, porque não tinha nada de errado, nós todos fomos fundamentados tecnicamente em dados oficiais. Aí o governo entrou como uma ação no TRE dizendo que nós estávamos fazendo uma propaganda antecipada, nociva contra Aécio Neves e Antonio Anastasia, uma campanha eleitoral, também não conseguiu ter uma liminar. Tentou no Plenário do TRE, também não conseguiu reverter o quadro, porque não tem nada, não é uma crítica à honra das pessoas, é um debate em cima de ideias, projetos. Nós antecipamos os movimentos de rua soltando essas campanhas, não só do Sindifisco , mas de sindicatos combativos como o Sind-UTE, o Sind-Saúde. Foram importantes essas alianças com os sindicatos da área privada, o Sindieletro, o Sindágua, com os metalúrgicos. Eu acho que isso é importante. Eu sempre falo com a minha categoria que ela tem que ter consciência de classe. Como consciência de classe temos que saber o óbvio: nós pertencemos ao mundo do trabalho. Somos um trabalho intelectualizado, com autoridade, com poder de polícia, mas somos do mundo do trabalho. E o embate é permanente com o capital.

Você acredita que o Sindifisco fez com que a categoria passasse a pensar dessa forma, como classe trabalhadora?

Conseguimos. Havia esse negócio se éramos trabalhadores ou autoridade, mas hoje eles têm a consciência disso. A dificuldade que tivemos, inclusive na eleição ficou claro isso. Por exemplo, na ativa nós vencemos, nós perdemos nos aposentados. O aposentado, por ele estar mais distante, às vezes a informação chega distorcida, o acesso não é grande. E a gente tem uma associação que tem o acesso direto ao aposentado, tem os planos de saúde, as colônias de férias. E mesmo com esse ganho significativo, ele acabou não votando na gente. Entendo que talvez por uma desinformação, por uma visão equivocada, ou por uma visão conservadora, por achar que você consegue as coisas elogiando o governo, ou se curvando ao governo. Entre o pessoal da ativa da Região Metropolitana de Belo Horizonte nós ganhamos, mas tivemos problemas com os aposentados. Isso significa que ela entendeu. Toda essa campanha foi fruto de um debate em assembleia, em fóruns coletivos de conselho deliberativo ampliado. Acho que demos um passo importante nisso. Havia essa dúvida, mas acho que nós avançamos bastante. E tenho colocado para nossa categoria que a gente só vai conseguir ser valorizado, se manter com padrão de remuneração digno se fizermos alianças com o mundo do trabalho. Nós tivemos um problema com esta campanha: a Fiemg saiu em defesa do governo contra o Sindifisco. Nós tivemos um cenário adverso, com tudo contra a gente: o governo, a Fiemg, um outro sindicato, que tinha luta sobre um negócio de atribuição, a oposição conservadora. A gente tinha tudo isso e conseguimos sair com resultado. Conseguimos obstruir perdas que tinham várias ameaças, sair com alguns ganhos. Essa visão que a categoria deve ter. Com as alianças que temos que fazer é com os trabalhadores, trazer os trabalhadores para discutir reforma tributária, para debater orçamento, fornecer informação, fomentar o debate. Acho que nisso nós avançamos bastante. Isso melhora a imagem da fiscalização também.

O enfrentamento com o governo continuará, mesmo na base?

Isso continua, porque sempre fiz o que acredito. Mas tenho alguns problemas. Não tenho mais imunidade que tem o sindicalista. Para você ter uma ideia, um colega que fez uma monografia questionando o choque de gestão foi chamado no Conselho de Ética. Aqui é uma repressão interna muito grande. Vai continuar o enfrentamento, com a consciência de que eu tenho essa psudoimunidade de sindicalista e ela vai acabar. É preciso ter cuidado, a pressão é muito grande em cima. Eles alegam a questão do sigilo fiscal, mas usam o sigilo fiscal como forma para implantar a censura, para poder punir, constranger servidor público. A gente vai atuar como base dentro de um limite, porque a função nossa é muito vigiada. O governo se preocupa mais em controlar o fiscal, do que controlar o contribuinte. Chegar a questionar uma monografia de um colega, porque ele estava fazendo um questionamento do choque de gestão. Ele estava fazendo como cidadão. Para você ver o nível de repressão interna que nós temos aqui. A gente vai continuar sabendo disso, os limites que a gente tem.

A parceria com a CUT foi importante para sua atuação sindical?

O relacionamento com a Central e com a presidenta que foi bastante profícuo, diga-se de passagem que foi construído na luta, nos embates com o governo. E a relação de confiança se constrói dessa forma, não é pela eleição ou pelo nome do sindicato e, sim, por essa convivência da luta. Foi uma convivência importante. Hoje o fato de a Beatriz estar à frente da Central facilitou, nós nos aproximamos bastante. Embora não sejamos filiados à Central, nós fizemos uma parceria muito grande neste período com os demais sindicatos que são filiados às centrais montamos uma rede de resistência à esse pensamento único em Minas Gerais, do governo de Minas, essa censura. Foi muito importante esse relacionamento e fizemos uma série de atividades juntos. Participação no Comitê de Negociação Sindical (Cones), participação na Assembleia Legislativa, audiências públicas, movimentos de rua, isso foi muito importante. E essa aproximação, ultimamente, que foi a questão do plebiscito da energia elétrica, onde nós entramos com algo até então desconhecido dos trabalhadores que pagam um absurdo, a maior alíquota de ICMS da conta de energia elétrica. Este foi um trabalho não só com as centrais, mas com os movimentos sociais. A parceria com a CUT e inserir o sindicato nos movimentos sociais foram, para mim, o grande ganho desta gestão. Enfrentamos problemas sérios, tem um setor conservador muito complicado. Questionando, inclusive, até o jornal Brasil de Fato. Como se aquilo fosse um jornal de uma facção de esquerda subversiva, que se fosse não teria problema nenhum. Eu expliquei para eles que é uma questão alternativa. Você vê que nós enfrentamos isso. A postura da chapa eleita é horrorosa com relação à aproximação. Ela acha que tem de se aproximar das carreiras típicas, do ministério público. Tem que se aproximar, mas precisa ver se este pessoal quer se aproximar da gente. Uma coisa não é conflitante com a outra. Pode se aproximar das outras que eu tenho dito para eles: se a gente precisa de aliado, nossos aliados são os trabalhadores.

Na sua opinião, quais são as perspectivas políticas e econômicas para 2014?

Eu acho que Minas está quebrada. O que foi feito com relação essa questão recente de extinguir um fundo de pensão, privatizar a previdência, com uma previdência complementar, deu uma demonstração clara de que o Estado está numa situação financeira difícil. Vejo o cenário difícil, acho que depois da Copa do Mundo, e há uma previsão, que pode vir uma crise por aí. Vamos ter problemas sérios. Acho que para o servidor não é um cenário fácil. Pode se avançar, desde que tenha muita luta. Então eu acho que os sindicatos têm de se preparar para um cenário complicado. Está na hora de termos uma alternância no poder aqui em Minas Gerais. Não dá para ficar esse pensamento único durante tanto tempo. Este choque de gestão, este modelo do PSBD já mostrou que é falido. Vejo que a gente pode tentar fazer uma mudança política aqui no cenário estadual. Mas vejo um cenário difícil. Não vejo uma perspectiva de crescimento bom da receita. As despesas estão crescendo às vezes um pouco acima da evolução da receita. O Estado é endividado, o segundo em termos reais de receita corrente líquida. É um Estado com problemas sérios, que não investe o mínimo em saúde e educação. Nós somos o 24° em aplicação em saúde e educação se você comparar com a receita corrente líquida. Eu vejo um cenário muito difícil. Um cenário pesado e aí não dá para o movimento sindical vacilar, tem que estar sempre lutando. É luta permanente, sempre tentar ser combativo. Não é ser contra por ser contra, porque o modelo de Estado apresentado pelos governos é conflitante com a melhoria do serviço público, com a valorização do servidor público. É um cenário difícil e acho que para reverter isto é preciso de luta permanente. É para isto é preciso união dos trabalhadores, dos sindicatos mais combativos.