Servidores da Arsae-MG deflagram greve histórica e cobram autonomia e valorização
Os servidores da autarquia e do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) mantêm uma greve histórica. A categoria reivindica valorização das carreiras, autonomia orçamentária e reposição do
Publicado: 23 Outubro, 2025 - 11h04
Escrito por: Sindsema
Enquanto o Projeto de Lei nº 4.552/2025, que amplia as competências da Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário de Minas Gerais (Arsae-MG), tramita na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, os servidores da autarquia e do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) mantêm uma greve histórica — a primeira de uma agência reguladora infranacional no Brasil.
A categoria reivindica valorização das carreiras, autonomia orçamentária e reposição do quadro funcional, alertando que a expansão das atribuições da Arsae, sem reforço estrutural, pode comprometer a qualidade e a independência da regulação de serviços públicos essenciais em Minas Gerais.
Os servidores afirmam que a previsão de ampliação das atribuições da Agência não foi acompanhada por medidas de fortalecimento institucional, atualização salarial ou realização de concursos públicos no projeto de lei apresentado pelo governador Romeu Zema. Atualmente, a Arsae-MG opera com apenas 35 servidores efetivos, número insuficiente para fiscalizar os 634 municípios hoje regulados.
Com a aprovação do PL nº 4.552/2025, a atuação da Agência será ampliada para os 853 municípios mineiros, passando a abranger também os serviços de manejo de resíduos sólidos urbanos, drenagem e manejo de águas pluviais, serviço local de gás canalizado e, mediante convênio, distribuição de energia elétrica.A proporção resultante — um fiscal para cada 90 municípios — evidencia a sobrecarga e o risco de comprometimento da fiscalização. Para efeito de comparação, a Arsesp (SP) mantém cerca de um fiscal para cada 10 municípios e realiza novo concurso para ampliar seu quadro em mais 100 servidores.
Expansão de responsabilidades sem reforço estrutural
O PL 4552/2025, encaminhado pelo governo Zema, propõe que a Arsae-MG passe a regular novos setores, além de compartilhar seus cargos de regulação com a recém-criada Artemig, voltada ao transporte e mobilidade. Para os servidores, a medida amplia a sobrecarga e fragiliza a atuação técnica da Agência.
Atualmente, responsável por fiscalizar 634 municípios, a ARSAE-MG realizou mais de 300 fiscalizações apenas em 2024, determinou a devolução de R$ 534,5 milhões aos usuários, destinou R$ 170 milhões ao Programa de Proteção de Mananciais desde 2017 e habilitou 328 fundos municipais de saneamento para receber repasses dos prestadores regulados que somaram aproximadamente R$ 180 milhões anuais para financiar ações voltadas à universalização dos serviços.
Mesmo com resultados expressivos, a Agência enfrenta o esvaziamento de quadros e a falta de autonomia administrativa e orçamentária. E a situação tende a piorar se o PL 4552 for aprovado da forma que foi apresentado. Neste caso, a Arsae vai atuar nos 853 municípios em relação aos serviços que serão incluídos no escopo da Agência.
O paradoxo das receitas
Segundo dados apresentados ao Legislativo, a Arsae-MG arrecadou R$ 61,6 milhões em 2024 por meio da Taxa de Fiscalização dos Serviços de Saneamento (TFAS), mas executou apenas 29% desse valor em despesas. Estima-se que R$ 241 milhões em receitas vinculadas à fiscalização estejam retidos pelo Estado.
Com a aprovação do novo projeto de lei, a arrecadação poderá ultrapassar R$ 78 milhões anuais, sem previsão de ampliação do quadro técnico. Para os servidores, trata-se de um “paradoxo orçamentário”: sobram recursos, mas falta ação do governo para aplicá-los na valorização da carreira e no fortalecimento da regulação.
Proposta de autonomia e comparação com São Paulo
A principal reivindicação dos servidores é a concessão de autonomia orçamentária e financeira, nos moldes do modelo adotado em São Paulo pela Lei Complementar nº 1.413/2024, que permite que as agências paulistas (Arsesp, Artesp e SP-Águas) utilizem integralmente as receitas arrecadadas em suas atividades.
A proposta de emenda ao PL 4.662/2025 apresentada pela categoria prevê a criação de uma “Seção II — Da autonomia administrativa, orçamentária e financeira da Arsae-MG”, garantindo independência na gestão dos recursos e autorização para realizar concursos sempre que houver vacância superior a 10% do quadro.
Reconhecimento e riscos
Mesmo diante das limitações, a Arsae-MG acumula prêmios e reconhecimentos nacionais — como o Selo de Boas Práticas Regulatórias (MDIC, 2024) e o Prêmio FGV Direito (2023) —, figurando entre as três agências estaduais com maior grau de maturidade institucional.
Entretanto, o enfraquecimento do corpo técnico e a ausência de reposição de servidores colocam em risco a capacidade de fiscalização e a proteção do usuário mineiro frente a eventuais abusos tarifários, falhas contratuais e má prestação de serviços.
Impactos da greve
Com a greve dos servidores de carreira, o usuário fica mais vulnerável à má prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, pela falta de fiscais para verificar a qualidade da água, denúncias de baixa pressão ou interrupção no fornecimento de água, cobranças indevidas nas faturas, dentre outras possíveis ocorrências.
Além disso, o processo da 3ª Revisão Tarifária da Copasa também pode ser interrompido por falta de servidores suficientes para avaliar as contribuições da Consulta Pública encerrada em 1º de outubro e atualizar os cálculos dos resultados preliminares. A categoria ressalta que, com a greve, não há contador para atuar na revisão tarifária e que a Gerência de Informações Econômicas, responsável pelo recebimento e análise das informações contábeis e de faturamento da Copasa, está totalmente paralisada devido à adesão de todos os servidores efetivos ao movimento grevista.
Greve segue sem negociação
Até o momento, o Governo de Minas não apresentou proposta concreta às reivindicações dos servidores. A greve segue por tempo indeterminado, com adesão significativa e apoio de entidades sindicais e técnicas do setor ambiental.
Os servidores afirmam que o impasse ameaça a continuidade e a qualidade da regulação dos serviços públicos no estado. “O que está em jogo não é apenas o futuro da carreira, mas a própria capacidade de Minas Gerais de garantir serviços públicos de qualidade e tarifas justas para a população”, conclui a nota divulgada pela categoria.
